Durante o Foro Inteligência, advogado explicou o papel do judiciário brasileiro
O advogado e mestre em Direito, pela Universidade de Harvard, Conrado Hübner debateu na noite ontem (26/5), durante o Foro Inteligência, o papel do judiciário brasileiro. Para Hübner, o maior protagonismo político dos tribunais torna cada vez mais difícil distinguir o juízo político da interpretação técnica do direito na atuação das cortes brasileiras. A politização da justiça tem dois significados em sua opinião: o abandono de uma visão muito formal, legalista e mecânica da interpretação das leis e o comportamento destoado do direito por parte de juízes, que se pautam por fatores externos a essa ciência.
Segundo Hübner, o papel tradicional das cortes brasileiras, pré-constituição de 88, e até mesmo logo após a constituição de 88, era o de resolver as disputas entre particulares e casos de abusos de poder da administração pública. A constituição de 88 torna o poder judiciário o ator mais importante do controle do sistema político brasileiro. “A natureza dessa constituição fez com que, praticamente, não haja tema da política brasileira que não possa ser judicializável. Estabeleceu limites muito abertos nesse campo, abolindo os que estavam pré-estabelecidos”, afirma Hübner.
Na opinião do advogado, pode-se dizer que a judicialização da política no Brasil é uma espécie de pano de fundo institucional da politização da justiça. Esses dois aspectos são completados pelo ativismo judicial. É este tripé que sustenta o judiciário brasileiro contemporâneo, na sua visão. “Vemos uma espécie de extrapolação das competências judiciais tradicionalmente reconhecidas nas cortes, dentro da separação de poderes. Quando se diz que um tribunal foi ativista, no geral se quer dizer que ele usurpou. Sobretudo usurpou competências do poder legislativo. Em outras palavras, o tribunal legislou, não aplicou o direito”, completa Hübner. Segundo ele, em uma gradação dessas patologias, a politização seria a mais grave. “Para combater essa prática, precisamos encontrar métodos para saber e perceber como, quando e em que medidas um juiz passa a se comportar a partir de critérios da política”, ressalta.
É importante ressaltar que o elemento político pode ser determinante para o resultado da decisão judicial. “É possível encontrar alguns padrões de fuga da legalidade, que pode ser visto como outra forma de politização. É uma espécie de populismo disfarçado de jurisprudência. Percebemos isso em uma corte quando ela apela para ideias de sentimento social, de povo e para a voz das ruas”, revela Hübner.
Dentro desse campo da parcialidade judicial, há juízes que decidem, em algum sentido, em causa própria, diz o advogado, alertando para o fato de que o ideal de imparcialidade tem se corrompido de diversas maneiras. “O mecanismo da suspeição do juiz, que o judiciário precisa cultivar, tem sido abandonado, sobretudo por cortes superiores”, destaca Hübner.
Segundo ele, um ponto importante da politização é verificar nas cortes do judiciário uma espécie de pragmatismo de resultados, que foge um pouco da legalidade, porque destoa do papel do judiciário. “Essa ideia do judiciário como facilitador das reformas no país é uma grande distorção e pode ser vista como um tipo de postura populacionista do tribunal”, afirma Hübner. Ele ressalta que os juízes devem convencer a sociedade de que são merecedores de credibilidade e confiança como indivíduos e instituição.
Para finalizar, Hübner diz que o STF está em uma escalada a alguns anos de uma crise de institucionalidade e de confiabilidade. Mais que uma corte meramente exposta, ele acredita que a corte se deixou desgovernar do ponto de vista de procedimento, da conduta pública de juízes, se fez um tribunal muito frágil. “O STF não se comportou como uma espécie de moderador”, conclui o advogado.
Sobre o Foro Inteligência:
O Foro Inteligência reúne o BRICS Policy Center e a Insight, com o apoio do Instituto de Relações Internacionais (IRI) da PUC-Rio e da Casa de Afonso Arinos. Com a proposta de manter um canal aberto com países como China, Rússia, Índia e África do Sul, visa apresentar palestras, cursos e seminários abordando problemas brasileiros não convencionais e que tangenciam as nações do bloco.
O BRICS Policy Center fará a ponte com os países emergentes. Pela primeira vez, assuntos brasileiros profundos, como as facções criminosas, a questão das fronteiras do país, a ameaça dos supervírus e bactérias, gargalos da industrialização da indústria brasileira, e verdades e mentiras sobre o interesse do capital estrangeiro em investir no Brasil, serão acessados a partir de um olhar convergente com o eixo dos demais países emergentes.